17 de outubro de 2012

Congresso dos EUA não pode bloquear reajustes de juízes

INDEPENDÊNCIA DO JUDICIÁRIO

Congresso dos EUA não pode bloquear reajustes de juízes

Por João Ozorio de Melo

Por dez votos a dois, um Tribunal Federal de Recursos dos EUA decidiu que o Congresso não pode revogar reajustes salariais, sob o título de ajuda de custo de vida, garantidos aos juízes federais por uma lei aprovada em 1989, a “Ethics Reform Act”. O tribunal concluiu que o Congresso violou a “Cláusula da Remuneração” da Constituição dos EUA, que se destina a proteger a independência do Judiciário, ao aprovar legislação que bloqueou os reajustes. A notícia foi publicada nesta terça-feira (16/10) pelo site Law.com.

A Cláusula da Remuneração foi incluída na Constituição do país para impedir que membros do Executivo ou do Legislativo exerçam qualquer forma de controle sobre os juízes e de domínio sobre os tribunais, quando existem possibilidades de seus interesses serem contrariados por decisões judiciais. Essa cláusula limita a possibilidade de o Executivo ou o Legislativo reduzir os salários dos juízes, diz o Law.com.

“O Judiciário, o mais fraco dos três Poderes do governo, precisa proteger sua independência e não deixá-la à mercê de caprichos políticos”, escreveu o presidente do tribunal, juiz Rendall Rader, relatando em nome da maioria.

A lei aprovada em 1989, de acordo com a decisão, tornou obrigatórios reajustes de ajuda de custo para os juízes, de maneira não discricionária, como forma de compensar as limitações impostas à classe de obter rendimentos externos e de contrabalançar os efeitos da inflação. Os reajustes de ajuda de custo entram em vigor automaticamente, toda vez que um aumento salarial é concedido aos funcionários públicos.

“Se o Congresso quiser alterar a lei de 1989, pode fazer isso. Mas não de uma maneira que afete os juízes em atividade”, diz a decisão.

Em 2001, um tribunal federal de instância inferior tomou uma decisão contrária. Em uma ação coletiva movida por um grupo de juízes, o tribunal decidiu que futuros reajustes de salários não poderiam ser considerados como “remuneração protegida”. Consequentemente, o Congresso poderia bloqueá-los a seu critério. Posteriormente, um grupo de seis juízes ativos e inativos recorreu ao tribunal federal de recursos. Conseguiram agora a reforma da decisão anterior.

A Suprema Corte dos EUA foi solicitada a decidir o caso uma vez, mas não aceitou examiná-lo. Mas os juízes que emitiram o voto dissidente citaram uma decisão da Suprema Corte de 1980 (antes da lei de 1989, portanto), segundo a qual o Congresso pode revogar reajustes de ajuda de custo de vida antes de eles serem devidos. O voto da maioria examinou essa questão e concluiu que essa decisão antiga não se aplica, porque ela trata de um tipo de reajuste de ajuda de custo diferente.

A remuneração dos juízes também foi discutida no processo. Na condição de relator do voto da maioria, Rader comentou a defasagem entre os ganhos dos juízes e os dos advogados: “A diferença nunca foi tão grande. Hoje, um advogado com todas as qualificações para ser um bom juiz sequer pensa em se candidatar ao cargo, porque o prejuízo financeiro seria muito grande para ele. E muitos bons juízes deixam o cargo para atuar como advogados, porque aspiram a um melhor padrão de vida”, ele escreveu.

Ele citou, para exemplificar a atual situação salarial dos juízes americanos, o fato de o presidente da Suprema Corte dar prioridade à meta de ajustar o nível salarial dos juízes, advertindo que “quando os juízes qualificados dos tribunais de júri recebem a mesma remuneração anual de advogados em seu primeiro ano como associados de firmas de advocacia, como é o caso atualmente, isso mostra que o Poder Judiciário está em crise”.

João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.